Anos 2000 e tantos. Horas também já tantas da noite. Margarida e João Paulo na sala, ambos, absortos no seu interior. Totalmente distraídos e apartados um do outro. Lá fora e de rompante uma explosão. Miúdos na cama, já há horas. Pânico instalado. Olham um para o outro. Abraçam-se. Correm de mão dada, ela puxada por ele para o quarto dos fundos. Um desastre. As duas pequenas camas rigorosamente revoltadas. Janelas estilhaçadas no chão. E uma voz chorosa: “-Mãe… tenho medo”. Voz do Manelinho. E a Teresinha? Onde estaria? “-João Paulo, João Paulo, a Teresinha, a Teresinha?” Grita a Margarida. “Manelinho anda à Mãe, devagarinho.” De imediato sobe pelo seu corpo a cima. Agrafando-se com todas as forças. “-Teresa, Teresa”, gritam os dois. “-Onde estás?”. Nada. Nem sinal. As explosões continuam a ouvir-se e a ver-se, pelas janelas enormes da casa. É o grupo dos ‘Mortos’, como se intitulam. “-Margarida, vou ao sótão, ver se a Teresa está na casinha das bonecas”, segreda João Paulo. “-Querida, não tenhas medo, o Pai está aqui. Está tudo bem. Já passou.”. Mais explosões, cada vez mais fortes. Num repente, entram pela porta. Altas horas da noite. “-Sr. Dr.” grita. “-Sou eu, a Amélia. Venho buscá-los.”. “‘Os Mortos’ disseram ao meu marido que iam pilhar todas as casas da rua para darem de comer aos filhos.”. “Não tarda, entram cá em casa. Venham. Venham comigo.”. “Para nossa casa. Não temos nada... Lá ninguém vos faz mal.”. Casa, carro e todos os bens de Margarida e João Paulo, e das crianças, completamente subtraídos e destruídos. Paz para esta ‘nova’ família, agora, a partir daquele momento, só na pequena casa da Amélia e do Sr. Luís, seus fiéis empregados. Caso contrário nem pão nem água. Será este o Paradoxo que nos espera ou o novo Paradigma do Futuro?
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